Esse estudo visou conciliar o conhecimento científico e popular para avaliar a possibilidade da utilização do ingá na composição de agroecossistemas cafeeiros, como uma estratégia de controle biológico conservativo. Os objetivos do primeiro capítulo foram: registrar como um grupo de agricultores familiares do município de Araponga, Zona da Mata Mineira, percebe o termo “inseto” e as interações desses insetos com os agroecossistemas; descrever os diferentes conhecimentos de usos dos insetos por esses agricultores; listar quais plantas são utilizadas por esses agricultores na diversificação dos SAFs visando o controle biológico das pragas do cafeeiro. Foram entrevistados cinco agricultores através de entrevistas semi-estruturadas e listas livres. O domínio semântico “inseto” é utilizado pelos agricultores como uma categoria etnotaxonômica ampla, que reúne organismos de diversos taxa como anelídeos, moluscos e fungos. Eles reconhecem interações positivas e negativas entre os insetos e a cafeicultura, mas não consideram esses insetos pragas. Foram listados 12 etnocategorias de “insetos” que prejudicam a lavoura de café, sendo o “bicho-mineiro” o mais frequentemente citado. Os agricultores reconheceram 11 “insetos” utilizáveis na alimentação, na adubação, no controle de pragas, como medicamento e como indicador de qualidade ambiental. Foram reconhecidas18 plantas que podem beneficiar o café por auxiliar no controle das suas pragas. Esse controle foi associado ao fato dessas plantas atraírem ou repelirem os insetos, evitando a herbivoria no café ou melhorarem a qualidade do solo, aumentando a resistência do café contra as pragas. Diversos outros usos foram reconhecidos nessas plantas, o que favorece a permanência das mesmas nas propriedades. O ingá foi a árvore citada com maior frequência e com maior número de usos. O ingá possui nectários extraflorais (NEFs) que podem atrair inimigos naturais, por fornecer alimento alternativo, e protegê-lo contra a herbivoria. Pouco se sabe sobre o efeito dos NEFs na proteção de plantas adjacentes. Dessa forma, os objetivos do segundo capítulo desse trabalho foram: avaliar o possível efeito dos NEFs na diminuição da herbivoria no café pelas pragas-chave bicho-mineiro do café, Leucoptera coffeella (Guérin-Mèneville), e broca-do-café, Hypothenemus hampei (Ferrari), bem como identificar os principais grupos de insetos envolvidos nesse processo; e avaliar o possível efeito desses NEFs na eficiência do parasitismo sobre o bicho-mineiro do café. Esse estudo foi realizado em cinco SAFs no município de Araponga, MG. Em cada SAF foram amostradas cinco árvores de ingá. As coletas foram realizadas em 30 folhas em cada árvore de seis às 18 horas, a cada duas horas. Os artrópodes foram coletados por sucção, identificados e discriminados por grupos funcionais: predadores, formigas, parasitoides e herbívoros. Para a avaliação dos danos foram calculadas as frequências de folhas minadas e de frutos brocados. Para a coleta de inimigos naturais e a estimativa de parasitismo nas folhas minadas foram coletadas folhas com minas, que foram individualizadas até que emergissem os adultos de L. coffeella ou os parasitoides. Todas as coletas foram realizadas em transectos de 10 metros partindo de cada árvore de ingá amostrada, a fim de se avaliar o efeito da distância do ingá nessas variáveis. Nos SAFs amostrados foram coletados 747 visitantes nos NEFs dos ingás, distribuídos em 165 morfoespécies. Dentre esses foram identificados inimigos naturais das pragas do cafeeiro. A abundância dos diferentes grupos de insetos variou ao longo das horas do dia, sendo formigas e outros predadores mais abundantes ao meio dia e os parasitoides no fim da tarde. A abundância de parasitoides nos NEFs foi positivamente influenciada pela abundancia de formigas. A frequência de frutos brocados diminuiu somente com a riqueza de parasitoides e abundância de predadores nos ingás. A riqueza e abundância dos inimigos naturais visistantes nos NEFs dos ingás não influenciaram a frequência de folhas minadas. Foram identificadas sete espécies de parasitoides de L. coffeella nas folhas de café minadas amostradas nos SAFs. A frequência de parasitismo nas folhas minadas aumentou com a abundância de predadores e formigas nos ingás e não respondeu as demais riquezas e abundâncias. A distância entre as árvores de ingá e as plantas de café não influenciou nos danos causados pelas pragas ou no parasitismo do bicho-mineiro. Os resultados obtidos indicam que interações multitróficas são influenciadas pelos NEFs dos ingás e influenciam na herbivoria do café. O ingá atrai e oferece alimento alternativo para potenciais inimigos naturais das pragas do café, diminuindo o dano causado pela broca-do-café e aumentando o parasitismo no bicho-mineiro do café. Assim, a utilização do ingá em agroecossistemas cafeeiros pode constituir uma estratégia para o controle biológico conservativo.
The aim of this work was to reconcile scientific and popular knowledge to assess the possibility of using the inga tree in coffee agroecosystems as a strategy for conservation biological control. The goals of the first chapter were to register the perception of small farmers who grow coffee in agroforestry systems in the municipality of Araponga, Minas Gerais, Brazil, of the term "insect" and the interactions of these insects with agroecosystems; to describe the knowledge of uses of insects by these farmers; and to list which plants are used by these farmers in the diversification of agroforestry systems with the purpose to control of coffee pests. Five farmers were interviewed through semi-structured questionnaires and free listings. The semantic domain "insect" was used by these farmers as a wide ethnotaxonomic category, joining various organisms such as annelids, mollusks and fungi. They recognized positive and negative interactions between insects and coffee, but they did not consider these insect as pests. They listed 12 ethnocategories of insects that damage the coffee crop; the "coffee leafminer" was cited most. The farmers recognized 11 "insects" usable as food source, for soil fertilization, pest control, medicine and as an indicator of environmental quality. They recognized 18 plants that help in management of coffee pests. The pest control was associated with the attraction or repellence of insects by plants, or improving soil quality which increases the resistance of coffee against pests. Several other uses of plants were mentioned, which explain the use of these species in the farms. The inga tree was cited most frequently and with more diversified functions. Ingas have extrafloral nectaries (EFNs) that can attract natural enemies by providing alternative food, thus protect the tree against herbivory. Little is known about the effect of EFNs on neighbouring plants. Thus, the goals of the second chapter of this study were to assess the possible effect of EFNs in reducing herbivory by the coffee leafminer, Leucoptera coffeella (Mèneville-Guerin) and coffee berry borer, Hypothenemus hampei (Ferrari) on coffee crops and to identify the major insect groups involved in this process. The effects of EFNs on parasitism of the coffee leafminer were evaluated through a correlative study. This study was conducted in five agroforestry systems in the county of Araponga, MG. In each system, 30 leaves of five inga trees were sampled every two hours during the day. All arthropods were collected with suction, identified and categorized by their functional groups: predators, predatory ants, parasitoids and herbivores. For the assessment of damage, the frequencies of mined leaves and bored fruits were calculated. For the collection of natural enemies and to estimate the parasitism in mined leaves, we collected leaves with mines, which were incubated until emergence of adult L. coffeella or parasitoids. All samples were collected in transects of 10 meters starting from each inga tree sampled, in order to evaluate the effect of the distance from the inga tree on these variables. A total of 747 and 165 morphospecies were found to visit the EFNs. Among these visitors were natural enemies of coffee pests. The abundance of different insect groups varied throughout the hours. Ants and predators were more abundant at midday and parasitoids at afternoon. The abundance of parasitoids in the EFNs was positively influenced by the abundance of ants. The frequency of bored fruits decreased only with the richness of parasitoids and abundance of predators at the EFNs. The richness and abundance of natural enemies in inga‟s EFNs did not influence the frequency of mined leaves. Seven species of parasitoid of L. coffeella were collected at the agroforestry systems. The frequency of parasitism in mined leaves increased with the abundance of predators and ants in inga trees and showed no correlation with the richness and abundance of the other natural enemies. The distance from the inga trees did not influence the damage caused by herbivory or parasitism of the coffee leafminer. The results indicate that multitrophic interactions are influenced by the EFNs of the inga and it affects the herbivory in the coffee crops. It can be concluded that inga trees attract and offer alternative food for potential natural enemies of coffee pests, reducing the damage caused by the coffee berry borer and increasing parasitism in the coffee leafminer. Therefore, the use of inga tree in coffee agroecosystems may be a good strategy for conservation biological control.